TJBA - DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO - Nº 3.167- Disponibilização: terça-feira, 30 de agosto de 2022
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Assim, cabe perquirir se o requerente efetivamente firmou contrato com o demandado para abertura de conta corrente, de modo
a permitir a cobrança das tarifas ora impugnadas.
Ao ter em mente que compete ao banco requerido demonstrar a celebração da avença fustigada, nos termos do art. 14, § 3º do
CDC, não obstante a contestação faça alusão a termo assinado pelo requerente para fins de abertura de conta corrente, pontua-se que o requerido não se desincumbiu de seu ônus probatório, já que nenhum documento nesse sentido fora juntado, bem
como a imagem colacionada no bojo da defesa apenas ratifica que, de fato, o autor utiliza sua conta bancária tão somente para
fins de recebimento de seu benefício previdenciário, consoante extratos, não havendo nenhuma movimentação que enseje a
cobrança das tarifas apontadas, o que deixa entrever a falha na prestação de serviço por parte do banco reclamado.
Por conta disso, violou-se o art. 2º, § 1º, I, da resolução supracitada, que possui a seguinte redação: “A vedação à cobrança de
tarifas referida no inciso I aplica-se, inclusive, às operações de: I - saques, totais ou parciais, dos créditos;”
Pelo que se depreende dos autos, houve uma abertura unilateral e indevida de conta corrente em nome do requerido, o que se
revela como uma prática abusiva vedada pelo art. 39, III, IV e VI do CDC.
No mesmo sentido caminha a jurisprudência do e. TJ/BA, conforme aresto paradigmático adiante, o qual além de ser semelhante
ao caso em apreço, tem o ora requerido como recorrente:
RECURSO INOMINADO. CONTRATO BANCÁRIO. CONTA PARA RECEBIMENTO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. COBRANÇA DE CESTA B EXPRESSO. AUSÊNCIA DE PROVA DA CONTRATAÇÃO OU MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA COMPATÍVEL COM A COBRANÇA. RESTITUIÇÃO DEVIDA. DANOS MORAIS. OCORRÊNCIA. FIXADO EM VALOR EXCESSIVO.
NECESSIDADE DE REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO EM ATENÇÃO AOS CRITÉRIOS DE RAZOABILIDADE E
PROPORCIONALIDADE. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE. RECURSO PROVIDO EM PARTE. (RECURSO INOMINADO
n 0000269-87.2020.8.05.0110, 3ª Turma Recursal, Juíza relatora Tâmara Libório Dias Teixeira de Freitas Silva, DJe 17.03.2021).
Dessa maneira, presumo verdadeiros os fatos aduzidos pelo autor, nos termos do inciso I do art. 400 do CPC, sendo imperioso
resolver o alegado contrato de abertura de conta corrente e, ato contínuo, determinar, a título de obrigação de fazer a ser cumprida em até cinco dias após o trânsito em julgado, a conversão de conta corrente para conta benefício ou, na sua comprovada
impossibilidade, a abertura desta última em nome do requerente, sob pena de multa diária que ora arbitro em R$ 200,00 (duzentos reais), limitada ao valor de R$ 6.000,00 (seis mil reais).
Destaca-se que, uma vez reconhecida a inexistência do contrato de abertura de conta corrente e, por consequência, a irregularidade dos descontos, é automática a condenação de restituição dos valores indevidamente descontados, que no presente
caso perfaz a cifra de R$ 918,13 (novecentos e dezoito reais e treze centavos), conforme extratos juntados, e das cobranças por
ventura efetuadas no curso do processo, em observância ao art. 323 do CPC, já que a relação estabelecida entre as partes é de
trato sucessivo.
Ressalta-se que a restituição em comento dar-se-á de forma simples, tendo em vista que a má-fé da instituição financeira não
ficou devidamente comprovada, ônus que compete ao requerente, pois a mera falta de prudência não autoriza o seu reconhecimento, especialmente em nosso ordenamento jurídico, em que a boa-fé é presumida.
Demonstrando-se indevidos os descontos levados a efeito pelo requerido no benefício previdenciário da parte autora, eis que
desprovidos de lastro em contrato regularmente firmado, evidente revela-sa o direito de o demandante receber uma indenização
pelos danos morais decorrentes de tal conduta ilícita.
A personalidade é um bem extrapatrimonial resguardado, acima de tudo, pela Constituição Federal, dentre os direitos fundamentais e princípios da República Federativa do Brasil, essencialmente por meio da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III).
A dignidade da pessoa humana abarca toda e qualquer proteção à pessoa, seja física, seja psicológica. Tanto que dela decorrem
os direitos individuais e dentre eles se encontra a proteção à personalidade, cabendo indenização em caso de dano, conforme
estabelece o art. 5º, inc. V: “[...] é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;”
Privilegiando os aludidos dispositivos está o Código Civil: “Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou
imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”; “Art. 927. Aquele que, por
ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”.
Consoante a este diploma legal encontra-se o Código de Defesa do Consumidor: “Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;”
Todos estes dispositivos legais vêm demonstrar que a proteção à personalidade está plenamente presente em nosso ordenamento jurídico pátrio, privilegiando o Estado Democrático de Direito e o indivíduo como sujeito principal da proteção estatal.
Destarte, é certo que tendo havido cobranças indevidas a título de tarifas bancárias, houve também inconteste dano moral ao autor, que nesse caso é considerado in re ipsa, ante o defeito na prestação do serviço, eis que lhe causou uma série de percalços,
sendo este Poder a sua última alternativa.
Outro não é o entendimento do Tribunal da Cidadania acerca dessa concepção de dano moral: “[…] No sistema jurídico atual,
não se cogita da prova acerca da existência de dano decorrente da violação aos direitos da personalidade, dentre eles a intimidade, imagem, honra e reputação, já que, na espécie, o dano é presumido pela simples violação ao bem jurídico tutelado”. (Resp
506.437/SP, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, QUARTA TURMA, julgado em 16/09/2003, DJ 06/10/2003, p. 280).
Desse modo, deve o banco acionado responder pelos transtornos que causam abalo moral ao autor, tendo restado comprovado
o nexo de causalidade entre a conduta do promovido e os danos sofridos, de sorte que tenho por justo e razoável arbitrar o valor
em R$ 8.500,00 (oito mil e quinhentos reais).
EX POSITIS,
Extingo o feito com resolução do mérito, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão autoral para:
a) REJEITAR a preliminar de ausência de interesse processual;
b) RESOLVER o contrato de abertura de conta corrente de titularidade do autor;
c) DETERMINAR, a título de obrigação de fazer a ser cumprida em até cinco dias após o trânsito em julgado, a conversão de
conta corrente para conta benefício ou, na sua comprovada impossibilidade, a abertura desta última em nome do requerente, sob
pena de mult diária que ora arbitro em R$ 200,00 (duzentos reais), limitada ao valor de R$ 6.000,00 (seis mil reais).