Edição nº 173/2018
Brasília - DF, disponibilização terça-feira, 11 de setembro de 2018
personalidade jurídica é exceção, somente cabível, ao menos na esfera cível, quando se fizer prova da insolvência e do abuso da personalidade
jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial (art. 50 do Código Civil). 2. O desvio de finalidade consiste no
direcionamento da sociedade para atividades diferentes daquelas que constam em seu contrato social, e a confusão patrimonial se caracteriza
pela transferência do patrimônio social para o nome de administradores ou sócios. 3. Para possibilitar a desconsideração da personalidade
jurídica e o redirecionamento da execução contra os administradores e sócios da empresa, é necessária a prova inequívoca do abuso da
personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial. 4. Agravo de instrumento provido. ACÓRDÃO
Acordam os Senhores Desembargadores do(a) 1? Turma C?vel do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, HECTOR VALVERDE
SANTANA - Relator, TE?FILO CAETANO - 1º Vogal e R?MULO DE ARA?JO MENDES - 2º Vogal, sob a Presidência do Senhor Desembargador
R?MULO DE ARA?JO MENDES, em proferir a seguinte decisão: CONHECIDO. PROVIDO. UN?NIME., de acordo com a ata do julgamento e
notas taquigráficas. Brasília (DF), 05 de Setembro de 2018 Desembargador HECTOR VALVERDE SANTANA Relator RELATÓRIO Trata-se de
agravo de instrumento interposto contra a decisão proferida em sede de cumprimento de sentença que deferiu o pedido formulado pela exequente,
ora agravada, de desconsideração da personalidade jurídica. Os agravantes afirmam que, conforme se percebe da leitura do artigo 50 do Código
Civil, a desconsideração da personalidade jurídica da empresa somente é cabível nos casos em que houver a prova inequívoca de abuso da
personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial. Asseguram que, na espécie, a exequente busca
a desconsideração pelo simples fato de a empresa estar em local incerto e não sabido. Ressaltam que a própria agravada, em sua petição,
reconheceu que a empresa ainda está em atividade. O único e exclusivo fundamento do pedido da agravante foi o de que a empresa ?não
se encontra no endereço declarado junto Receita Federal do Brasil?. Avaliam que, nestas situações, a jurisprudência aponta não ser cabível
a medida extrema. Colacionam julgados em favor da tese por eles defendida. Argumentam que o Juízo de Primeiro Grau utilizou-se de forma
equivocada do paradigma mencionado em sua decisão, visto que no caso relatado, a empresa havia sido encerrada ?após a citação para
pagamento?, fato que não ocorreu neste feito. Requerem a antecipação dos efeitos da tutela recursal, para que o Juízo de Primeiro Grau deixe
de deferir qualquer medida constritiva em face dos agravantes. No mérito, pleiteiam a confirmação da decisão antecipatória e o provimento
do presente recurso. Sem preparo, em face da isenção legal. Esta Relatoria deferiu o pedido de antecipação dos efeitos da tutela recursal, e
determinou que o Juízo de Primeiro Grau se abstivesse de deferir qualquer medida constritiva em face dos agravantes, até o ulterior julgamento do
presente agravo de instrumento. (ID n. 4466164). Contrarrazões apresentadas (ID n. 4688787). É o relatório. VOTOS O Senhor Desembargador
HECTOR VALVERDE SANTANA - Relator Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do agravo de instrumento. Trata-se de agravo
de instrumento interposto contra a decisão proferida em sede de cumprimento de sentença que deferiu o pedido formulado pela exequente,
ora agravada, de desconsideração da personalidade jurídica. Não observo qualquer fato novo capaz de modificar o entendimento exposto por
ocasião da apreciação do pedido de antecipação dos efeitos da tutela recursal, motivo pelo qual adoto, como razões de decidir, os fundamentos
da decisão anteriormente proferida, que ora transcrevo: ?Os recursos não impedem a eficácia da decisão recorrida (art. 995, caput, do Código
de Processo Civil). O relator poderá suspender a eficácia da decisão ou, sendo esta de conteúdo negativo, conceder a medida pleiteada como
mérito do recurso, se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a
probabilidade de provimento do recurso (art. 995, parágrafo único, do Código de Processo Civil). Há, portanto, dois pressupostos cumulativos a
serem considerados pelo relator: a probabilidade de provimento e o perigo da demora. Na estreita via de cognição prevista para o processamento
e julgamento do presente recurso, os requisitos se fazem presentes. A desconsideração da personalidade jurídica é exceção, somente cabível,
ao menos na esfera cível, quando se fizer prova da insolvência e do abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou
pela confusão patrimonial (art. 50 do Código Civil). O desvio de finalidade consiste no direcionamento da sociedade para atividades diferentes
daquelas que constam em seu contrato social, e a confusão patrimonial se caracteriza pela transferência do patrimônio social para o nome
de administradores ou sócios. O direito tributário, em razão de suas especificidades, trata o tema de maneira diversa, o que explica o fato de
o Superior Tribunal de Justiça permitir o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente quando a empresa deixa de funcionar no
seu domicílio sem comunicação aos órgãos competentes (Súmula n. 435). O posicionamento está amparado em disposições legais: o Código
Tributário Nacional estabelece que, nos casos de dissolução da sociedade empresária, os sócios respondem pela impossibilidade de exigência
do cumprimento da obrigação principal (art. 134, inc. VII), e os gerentes são pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a
obrigações tributárias resultantes de atos praticados com infração de lei (art. 135, inc. III). Veja-se jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça,
segundo a qual a aplicação do disposto na Súmula n. 435 limita-se aos casos relativos à execução fiscal: ?AGRAVO INTERNO NO AGRAVO
EM RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. 1. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. AUSÊNCIA DE BENS
PENHORÁVEIS. DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA EMPRESA. FUNDAMENTOS QUE, POR SI SÓS, SÃO INSUFICIENTES À APLICAÇÃO DA
MEDIDA. ILEGITIMIDADE DO SÓCIO PARA FIGURAR COMO PARTE PASSIVA NA EXECUÇÃO. EXTINÇÃO DO PROCESSO. ART. 485, VI, DO
CPC/2015. MANUTENÇÃO DA DELIBERAÇÃO MONOCRÁTICA. PRETENSÃO DE APLICAÇÃO DA SÚMULA 7/STJ AFASTADA. 2. INTENÇÃO
DE INCIDÊNCIA DA SÚMULA 435 DO STJ. RESTRIÇÃO AO ÂMBITO DA EXECUÇÃO FISCAL. 3. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. A
jurisprudência mais recente desta Casa assevera que "a mera demonstração de inexistência de patrimônio da pessoa jurídica ou de dissolução
irregular da empresa sem a devida baixa na junta comercial, por si sós, não ensejam a desconsideração da personalidade jurídica" (AgRg
no AREsp 347.476/DF, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 5/5/2016, DJe 17/5/2016). Decisão monocrática proferida em
consonância com o entendimento supra, não sendo o caso de aplicação da Súmula 7/STJ ao apelo nobre, pois a controvérsia dos autos demanda
apenas a revaloração jurídica dos fatos delineados no aresto impugnado. 2. A aplicação do disposto na Súmula 435 do STJ limita-se aos casos
relativos à execução fiscal. 3. Agravo interno desprovido. (AgInt no AREsp 1006296/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA
TURMA, julgado em 16/02/2017, DJe 24/02/2017).? O entendimento cristalizado no enunciado da Súmula n. 435 do Superior Tribunal de Justiça
não pode ser transposto para a esfera cível sem adaptações. É necessário adequá-lo ao art. 50 do Código Civil. Restou demonstrado que
as diligências efetuadas com o objetivo de localização de bens da empresa dos agravantes restaram infrutíferas, e há indícios de que houve
encerramento irregular das atividades. Contudo, a execução frustrada, simplesmente, não é apta a ensejar a desconsideração da personalidade
jurídica. A dissolução da empresa, ainda que irregular, não permite para as obrigações de direito civil a desconsideração da personalidade se não
houver prova do abuso desta. Nem sempre a dissolução, apesar de irregular, significará abuso de personalidade. Na prática cotidiana, observase que para formalizar a dissolução de uma empresa em débito com o Fisco, dando baixa perante as repartições fiscais, os sócios deverão
demonstrar a quitação prévia de todos os tributos. Muitas vezes a empresa não possui patrimônio para adimpli-los, assim como os sócios. Esse
raciocínio torna coerente o posicionamento tomado pelo Superior Tribunal de Justiça ao julgar o EREsp 1306553/SC. Na ocasião, consignouse que o encerramento das atividades ou dissolução da sociedade, ainda que irregulares, não são causas, por si só, para a desconsideração
da personalidade jurídica. Tratando-se de restrição ao princípio da autonomia patrimonial da pessoa jurídica, a interpretação que melhor se
adapta ao art. 50 do Código Civil é a que relega sua aplicação a casos extremos, em que a pessoa jurídica tenha sido instrumento para fins
fraudulentos: ?EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. ARTIGO 50, DO CC. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. REQUISITOS.
ENCERRAMENTO DAS ATIVIDADES OU DISSOLUÇÃO IRREGULARES DA SOCIEDADE. INSUFICIÊNCIA. DESVIO DE FINALIDADE OU
CONFUSÃO PATRIMONIAL. DOLO. NECESSIDADE. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA. ACOLHIMENTO. 1. A criação teórica da pessoa jurídica
foi avanço que permitiu o desenvolvimento da atividade econômica, ensejando a limitação dos riscos do empreendedor ao patrimônio destacado
para tal fim. Abusos no uso da personalidade jurídica justificaram, em lenta evolução jurisprudencial, posteriormente incorporada ao direito positivo
brasileiro, a tipificação de hipóteses em que se autoriza o levantamento do véu da personalidade jurídica para atingir o patrimônio de sócios que
dela dolosamente se prevaleceram para finalidades ilícitas. Tratando-se de regra de exceção, de restr ição ao princípio da autonomia patrimonial
da pessoa jurídica, a interpretação que melhor se coaduna com o art. 50 do Código Civil é a que relega sua aplicação a casos extremos, em que a
pessoa jurídica tenha sido instrumento para fins fraudulentos, configurado mediante o desvio da finalidade institucional ou a confusão patrimonial.
2. O encerramento das atividades ou dissolução, ainda que irregulares, da sociedade não são causas, por si só, para a desconsideração da
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