Disponibilização: quarta-feira, 15 de julho de 2015
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II
São Paulo, Ano VIII - Edição 1924
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cobrados. A liminar foi indeferida (fl. 44). O réu foi citado (fl. 49) e apresentou contestação, na qual defende a legalidade das
condições do negócio (fls. 50/57). Réplica às fls. 115/121. É o relatório. II. Fundamento e Decido. Os autos permitem o julgamento
antecipado da lide, nos termos do artigo 330, inciso I do Código de Processo Civil, pois a matéria em debate cinge-se a questões
unicamente de direito, não havendo necessidade de produção de outras provas. Os documentos colacionados pelas partes são
suficientes para embasar o julgamento. Os pedidos não podem ser acolhidos. A parte autora contraiu empréstimo bancário para
a aquisição do veículo da marca Ford, modelo Fiesta, ano/modelo 2005/2005, placa KUJ-7107, a ser pago em 60 prestações
mensais de R$ 474,81, a partir de 29/8/2011. A parte autora já quitou algumas prestações, mas entende que certas cláusulas
são nulas porque abusivas. Pois bem. A parte autora alega que a comissão de permanência está cumulada com outros encargos.
Todavia, ela não define em qual cláusula estaria prevista esta cumulação; sem informar, ainda, o respectivo valor. A alegação é
genérica e abstrata. De todo modo, observa-se que a comissão de permanência não é ilegal, nem mesmo a sua cumulação com
outros encargos. O crédito concedido ao cliente pelo banco está lastreado por um empréstimo que este realizou junto ao público
em geral, no âmbito do mercado financeiro. Este empréstimo também possui condições e prazos próprios a serem observados
por quem está captando os recursos. Quando o banco calcula o percentual de juros remuneratórios, ela considera diversos
fatores, inclusive o tempo de amortização da dívida, e as condições do seu empréstimo que servirá como lastro. E quando há
falta de pagamento da prestação pelo cliente, surge a necessidade de nova captação de recursos por parte da instituição
financeira, ocasionando um refinanciamento. Para se proteger das consequências do refinanciamento, o banco cobra a comissão
de permanência do seu cliente inadimplente, cuja regulamentação está descrita na Resolução 1.129/86 do Conselho Monetário
Nacional: “item I- Facultar aos bancos comerciais, bancos de desenvolvimento, bancos de investimento, caixas econômicas,
cooperativas de crédito, sociedades de crédito, financiamento e investimento e sociedades de arrendamento mercantil cobrar de
seus devedores por dia de atraso no pagamento ou na liquidação de seus débitos, além de juros de mora na forma da legislação
em vigor, ‘comissão de permanência’, que será calculada às mesmas taxas pactuadas no contrato original ou à taxa de mercado
do dia do pagamento.” Assim, há de se concluir que a comissão de permanência é encargo incidente nas hipóteses de
inadimplemento do cliente. Ela possui natureza, essencialmente, de juros remuneratórios; observando-se que os juros de mora
possuem natureza de encargo devido pelo atraso no cumprimento da obrigação e a multa possui natureza de cláusula penal. No
que concerne ao excesso de juros remuneratórios e sua capitalização, as alegações da parte autora também não convencem.
As prestações são fixas, de modo que a parte autora já tinha conhecimento do quanto deveria pagar desde o momento da
celebração do negócio. As condições entre as partes são claras e não dificultam a compreensão pelos contratantes. É fato
notório que as instituições financeiras impõem altos encargos em seus financiamentos. E no caso, a parte autora estava ciente
desta circunstância. Nota-se que não é ilegal a capitalização mensal sobre os juros cobrados, com sistema de amortização pela
Tabela Price. A Tabela Price consiste em um sistema de amortização em que todas as prestações possuem valor igual, sendo
que cada uma delas é composta por uma parcela de juros e uma parcela de capital. Dessa forma, com o pagamento de cada
prestação, sempre se amortiza uma parte dos juros devidos e uma parte do capital financiado. Salienta-se que a restrição
constante na Lei da Usura (Decreto 22.626/1933) não é aplicável às instituições financeiras (Súmula 596 do STF), sendo que é
lícita a capitalização mensal de juros, mormente porque se trata de financiamento contratado após a promulgação da Medida
Provisória 1963-17/2000 (reeditada sob o nº 2170/36). Não há qualquer inconstitucionalidade na edição da referida Medida
Provisória. O argumento comum de que o regramento sobre a capitalização dos juros não constitui matéria relevante e urgente
para ser tratada por meio de Medida Provisória não possui amparo legal ou fático. O art. 62 da Constituição Federal dispõe que,
em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo
submetê-las de imediato ao Congresso Nacional. Todavia, a relevância e urgência de uma Medida Provisória é matéria afeta à
discricionariedade do Presidente da República e do Congresso Nacional. Assim, somente nos casos de manifesto abuso de
poder é que o Judiciário pode apreciar a eventual ausência deste requisito. Ressalto também que a estipulação de juros
remuneratórios superiores a 12% ao ano não é abusiva, por si só (Súmula 382 do STJ). A redução é permitida, tão somente,
quando ocorrer onerosidade excessiva e discrepância dos juros com relação às demais operações praticadas no mercado
financeiro. Na espécie, os juros, embora elevados, não são exorbitantes nem manifestamente desproporcionais. Também não
extrapolam os padrões da prática bancária. A parte autora obteve indiscutível vantagem com os créditos que lhe foram
concedidos. Ela se aproveitou do financiamento oferecido, sem ressalva alguma, e por isso, não pode se furtar às consequências
de sua eventual inadimplência. Quanto às tarifas administrativas, elas não são igualmente abusivas. Quando da celebração do
negócio, a parte autora tinha ciência da existência das tarifas e aceitou receber os recursos oferecidos pelo banco, mediante o
pagamento de prestações fixas. O empréstimo foi contraído para a aquisição de um veículo, bem de consumo; e caberia à parte
autora recusar o financiamento, na hipótese de entender ser excessivo o seu valor. A legalidade da cobrança tem como
fundamento as normas editadas pelo Banco Central do Brasil. A Resolução 3518, de 06/12/2007, prevê que a cobrança de
tarifas e ressarcimento de serviços de terceiros, devem estar previstos no contrato firmado entre a instituição financeira e o
cliente ou ter sido o serviço previamente autorizado ou solicitado pelo usuário. A norma vedou apenas a cobrança dos chamados
serviços essenciais (art. 2º), permitindo-se a cobrança dos demais. Posteriormente, foi editada a Resolução 3919, em 25/11/2010,
que alterou alguns dispositivos da Resolução 3518/2007, mas manteve as regras acima. O seu art.1º assim dispõe: “A cobrança
de remuneração pela prestação de serviços por parte das instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar
pelo Banco Central do Brasil, conceituada como tarifa para fins desta resolução, deve estar prevista no contrato firmado entre a
instituição e o cliente ou ter sido o respectivo serviço previamente autorizado ou solicitado pelo cliente ou pelo usuário”. A
propósito, o Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento a respeito do tema, no julgamento do Recurso Especial nº
1.251.331: “CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM GARANTIA DE
ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. DIVERGÊNCIA. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. JUROS COMPOSTOS. MEDIDA PROVISÓRIA 2.17036/2001. RECURSOS REPETITIVOS. CPC, ART. 543-C. TARIFAS ADMINISTRATIVAS PARA ABERTURA DE CRÉDITO (TAC),
E EMISSÃO DE CARNÊ (TEC). EXPRESSA PREVISÃO CONTRATUAL. COBRANÇA. LEGITIMIDADE. PRECEDENTES.
MÚTUO ACESSÓRIO PARA PAGAMENTO PARCELADO DO IMPOSTO SOBRE OPERAÇÕES FINANCEIRAS (IOF).
POSSIBILIDADE. 1. “A capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara. A
previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da
taxa efetiva anual contratada” (2ª Seção, REsp 973.827/RS, julgado na forma do art. 543-C do CPC, acórdão de minha relatoria,
DJe de 24.9.2012). 2. Nos termos dos arts. 4º e 9º da Lei 4.595/1964, recebida pela Constituição como lei complementar,
compete ao Conselho Monetário Nacional dispor sobre taxa de juros e sobre a remuneração dos serviços bancários, e ao Banco
Central do Brasil fazer cumprir as normas expedidas pelo CMN. 3. Ao tempo da Resolução CMN 2.303/1996, a orientação
estatal quanto à cobrança de tarifas pelas instituições financeiras era essencialmente não intervencionista, vale dizer, “a
regulamentação facultava às instituições financeiras a cobrança pela prestação de quaisquer tipos de serviços, com exceção
daqueles que a norma definia como básicos, desde que fossem efetivamente contratados e prestados ao cliente, assim como
respeitassem os procedimentos voltados a assegurar a transparência da política de preços adotada pela instituição.” 4. Com o
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º